Aproveitando a polêmica que lancei sobre a abertura de Dan Da Dan, venho indicar o canal Anime Ken Tv que, por sua vez, analisou a abertura. Ele é músico profissional e é especialista em guitarra! Se clicar e gostar do vídeo, se inscreva lá e faça-o crescer! E, de forma inesperada, um youtuber japonês fez um vídeo essa semana desabafando sobre a solidão no Japão. O vídeo mostra que a crise da masculinidade, veja texto de segunda-feira da semana passada, está afetando o Japão com muita força. Samurai Daddy é casado, com filho, e se sente sozinho e solitário, muito por conta da confusão de papéis que vivemos hoje em dia. É um relato que confirma e aprofunda o tema da crise. Assistam!
Goblin Slayer
(Não aconselhável para menores)
(SPOILERS SPOILERS)
A melhor série da temporada de inverno de 2018
https://www.crunchyroll.com/goblin-slayer/videos
Sinopse CR: “Sobre a Série
Simulcast on Sábados 2:30pm -02
Uma jovem sacerdotisa forma seu primeiro bando de
aventureiros, mas eles imediatamente se metem em apuros. É então que o Goblin
Slayer vem a seu resgate - um homem que dedica sua vida a exterminar todos os
goblins, custe o que custar. E quando seus feitos começam a se espalhar,
ninguém sabe o que pode acontecer depois...”
Vamos direto ao ponto. Os contos de terror e fantasia, bem
como os contos de fadas, sempre tiveram a função de educação. Ensinar para
crianças e jovens os melhores caminhos para sua vida adulta. Para os garotos se
tornarem homens honrados, que respeitem os mais fracos, assim como para as
mulheres se tornarem sábias protetoras da vida, pois é em seu ventre que se
protege a vida humana desde seu início. Goblin Slayer é um excelente conto para jovens!
Ana Maria da Silva[1]: “O
texto ficcional amplia e mobiliza os limites do imaginário pessoal e coletivo.
Enquanto alguém lê ou conta histórias, nós nos reportamos ao ambiente em que
acontece o fato narrado e participamos do enredo.
Dentre os inúmeros textos pertencentes ao domínio
estético/artístico temos o conto. ‘O conto é um relato em prosa de fatos
fictícios’ (KAUFMAN & RODRÍGUEZ, 2005, p. 21). Este relato quando lido ou
ouvido tem o poder de despertar no leitor uma gama de sentimentos
indescritíveis, porque consta de três momentos perfeitamente diferenciados: O
conto começa apresentando um estado de equilíbrio, dá lugar a uma série de
episódios que se convertem em conflitos e culmina com a resolução destes
conflitos no estágio final”.
Eduardo Stark[2] complementa: “Uma mitologia não é apenas um conjunto de histórias que envolvem
deuses e heróis. Ela é na verdade um instrumento de poder em uma sociedade
organizada”.
Então, um bom conto é uma forma de bem educar e Goblin Slayer
é um ótimo representante dos contos de fantasia e explano abaixo os motivos.
O Herói, o Medo e a
Superação
Um herói cujo passado foi tomado pelo medo e o assombro de ver
sua amada irmã torturada e morta por monstros. Enquanto permanecia imóvel, ele
presenciou toda a violência cometida contra ela. Berrini[3]: “Um trauma
psicológico se refere às sequelas emocionais deixadas por uma experiência que
causou muita dor e sofrimento. Esta experiência é tão forte que chega a afetar
o comportamento, o pensamento, os sentimentos e as emoções da vítima (...) Nas
formas mais sérias, o período pós- traumático pode, ainda, deixar o paciente em
hipervigilância, que é quando ele sente como se algo estivesse sempre
espreitando para atacá-lo ou para acontecer, desinteresse pelo próprio futuro,
depressão, ansiedade e dificuldade de concentração e de aprendizagem.”
Goblin Slayer é um herói, mas também é uma vítima de um
trauma que o retirou sonhos, futuro e lhe deixou cativo de um sentimento de
vingança. Seu intelecto foi plenamente sequestrado pelas criaturas, ele está
sempre vigilante, contido, recluso, preso ao seu passado de uma maneira mais
sombria que os heróis como o Batman, pois ele não vive, ele sobrevive. A animação
demonstra bem esse sequestro de intelecto ao mostrar, por exemplo, que a visão
que ele tinha na infância é idêntica à visão que ele tem com o capacete que ele
quase nunca tira. Notem que as frestas do piso e do capacete são do mesmo
formato. Ele, ainda hoje, continua sendo aquele garoto escondido debaixo do
piso.
E, por isso mesmo, ele é aquele herói capaz de entrar na
escuridão mais sombria do inferno para ir te resgatar. Ele é o herói acostumado
ao medo. Como ele mesmo disse, chegou um momento que ele precisou andar, seguir
em frente, mesmo que parecesse que o chão iria se abrir aos seus pés.
Esse é um exemplo de superação de trauma que a série mostra
em desenvolvimento gradual. Ele tornou o medo dele em força para seguir, e
tornou-se um monstro para os monstros que ele persegue, dando o exemplo de que
toda a dor passa e tudo pode ser superado, principalmente se houver auxílio
externo. E o auxílio externo se dá pela presença de três personagens: a fazendeira,
a sacerdotisa e a elfa. Todas possuem interações para com ele de modo a tentar tirá-lo
de sua casca. E uma grande evolução ocorre nos episódios finais que brinda os
esforços delas em ajudá-lo a superar o trauma.
Diálogos e o silêncio
A série nos brinda com muita reflexão, pois muito do que se
apreende da série não é feito pelos diálogos. O personagem principal pouco
fala, então, o que aprendemos da série é pela reflexão e pelos sentimentos dos
personagens. Por exemplo, após o ritual
de ressurreição com a virgem, ele diz à sacerdotisa que ela não ficara com
nenhuma cicatriz. E ele não estava apenas se referindo à mordida do Goblin, que
quase arrancou o braço dela. Em todas as mesas de RPG, existe um custo para se
ressuscitar algum personagem. No caso da ressurreição usando virgens, o custo
pode variar, desde EXP, até o próprio sangue da virgem. Ao afirmar que ela não
havia ficado com cicatrizes, pode-se dizer que ela não arcou com custo algum.
Ela foi poupada.
Já nas cenas do diálogo do Goblin Slayer, com a Donzela das Espadas, ele
se surpreendeu por ela estar indefesa à mercê de seu medo de Goblins. Sim, a
dama que vencera o rei demônio adquiriu um trauma e fobia à Goblins e ele disse
não compreender isso. Novamente, muita introspecção. Voltando ao passado dele,
ele viu todo o horror. Ele conseguiu caminhar e se dedicar a uma causa. E,
provavelmente, ele presenciou sua irmã ser firme até à morte, sem cair em
desespero. Por sua experiência própria, Goblin Slayer não entende por que ela,
a Donzela das Espadas, ainda estava cativa desse medo. E, todavia, ele ainda
estende a mão, tentando ajudar. Quando ela suplica: “Você não pode me ajudar?”, ele responde: “Não!
Mas se precisar, chame-me e eu matarei todos os Goblins para você!”, e a dama
pergunta: “Mesmo em meus sonhos?” e ele responde com firmeza: “Sim! Eu sou o
Goblin Slayer!”. Nesse momento do diálogo, que quase decorei, ele a auxilia a
se livrar de se medo, tornando-se ele mesmo um objeto de consolo e de suporte para ela. Em
momentos de fobia, Goblin Slayer agora é, para a Dama das Espadas, um auxílio
emocional. E o negócio funcionou bem!
Então, a série te obriga a buscar as interações, as emoções
dos personagens para poder entender o que os diálogos apenas tocam superficialmente.
Isso fortalece o lado sensível do cérebro para compreensão das interações humanas,
além de ajudar na pesquisa e na busca por conhecimento. Por exemplo, aposto que
muita gente foi no YouTube procurar por explosão com farinha de trigo! Eu fui!
Os Goblins
Outra coisa impressionante na obra é o respeito para com a
mitologia dos personagens. Apesar de algumas pessoas insistirem que a série destruiu
a cultura Goblin, eu digo que a reconstruiu como ela era de fato. New World
Encyclopedia[4]
descreve-os em sua essência maligna: “A goblin is a mythical creature of
Germanic and British folklore, often believed to be the evil, or merely
mischievous, opposite of the more benevolent faeries and spirits of lore. Like
many such creatures, there is no single version of a goblin; the term is more
generic for those small creatures that live in dark places and cause trouble,
but in more recent years, the term has become more concentrated on
green-creatures that live in caves and terrorize children.
Despite local variations, goblins have almost universally
been described as troublemakers. They are either simply tricksters and
mischievous, like immature children, or malevolent, evil-doers dangerous to
human beings. Like many similar creatures, they have the characteristics of
spirits rather than beings existing in the physical world. Thus, they share
similarities with ghosts and and also with demons as associated with some
Christian teachings and lore”.
Os Goblins retratados na série são os mesmos retratados em
muitas mesas de RPG, com a união de diversos elementos para transformá-los em
seres únicos. Por exemplo, notaram que não existe uma goblin fêmea? É por essa razão que eles capturam fêmeas de outras espécies. É a forma cruel e nojenta de conseguirem se reproduzir. E como dizem na série: O Deus da Justiça veio para revelar que o
mal existe! Sim, ao presentar a audiência com a essência mais cruel destas
criaturas, o autor da série nos mostra o óbvio, existe o mal e ele deve ser
combatido.
Concluindo
Dessa forma, a audiência foi brindada com uma série complexa,
que mostra exemplos de superação de traumas, com um herói que lembra em muito
os heróis medievais que, mesmo conturbados, lutam por ti. GS entra em cavernas
para ir ao seu resgate, mostrando aos jovens que eles podem ser destemidos,
honrados e que devem sempre proteger. A série resgata a sensação do mal, que
foi abafada pela conduta dos intelectuais de Frankfurft e sua moral relativa. A
série te ensina a exercitar o lado afetivo e emocional, a se aprofundar não
somente no que é dito, mas no que está no silêncio dos personagens. Além disso
tudo, ele resgata a natureza perversa dessas criaturas mitológicas e deixa o
alerta no ar de que o mal existe.
Por isso, e muito mais que não consegui inserir no texto,
Goblin Slayer foi a melhor série da temporada passada!
[1]
Porta Educação, lido em 18/12/2018 em: < https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/a-importancia-da-leitura-dos-contos-de-fadas-na-educacao-infantil/30151>
[2]
Tolkien Brasil, lida em 18/12/2018 em: < http://tolkienbrasil.com/mitopoeia/tolkien-e-a-mitologia-para-a-inglaterra/>
[3] Berrini Psicologia, lido em 18/12/2018 em: < https://www.psicologosberrini.com.br/psicologia-e-psicologo/traumas-psicologicos/>
[4]
New World Encyclopedia, lido em 18/12/2018 em: < http://www.newworldencyclopedia.org/entry/Goblin>