O Preço da Liberdade e os Livros: Um Equilíbrio entre Cultura e Mercado
Por Patrick Raymundo de Moraes
Estagiário: ChatGPT 4o
Feito via Dall-E a meu pedido para ilustrar essa matéria! |
Em 28 de novembro do ano passado, recebi um e-mail da Câmara Brasileira do Livro com um conteúdo inspirador que decidi, hoje, analisar. O conteúdo do texto deixo na íntegra ao final da minha análise. Comecemos!
Livros e liberdade sempre caminharam lado a lado. Desde os primórdios da escrita, a busca pelo conhecimento impulsionou o desenvolvimento da humanidade, e nada simboliza melhor essa trajetória do que o mercado livre de livros. É por isso que a defesa de um mercado editorial equilibrado e justo, como exposto por Diego Drumond em seu artigo “O preço da liberdade e os livros”, é essencial para mantermos esse ciclo virtuoso de criação, distribuição e consumo cultural.
Drumond argumenta que os livros precisam ser livres, tanto em conteúdo quanto em preço, para preservar sua função como agentes culturais e econômicos. Essa defesa da liberdade econômica encontra ressonância direta com os princípios de Ludwig von Mises, economista que defendia o livre mercado como motor da civilização. Mas como garantir que esse mercado funcione de maneira justa sem sucumbir a práticas comerciais que sufocam livrarias e editoras menores?
A Função Social e Econômica do Livro
O livro, como produto, transcende o mero objeto de consumo. Ele é um veículo de ideias, um instrumento de transformação social e, ao mesmo tempo, um elemento fundamental de qualquer economia que valorize o conhecimento. Livrarias especializadas desempenham um papel crucial nesse processo: são pontos de encontro entre leitores e cultura, oferecendo curadoria e acessibilidade que grandes varejistas muitas vezes não conseguem replicar.
Quando livrarias fecham, a sociedade perde mais do que um espaço comercial; perde-se um espaço cultural. Por outro lado, a prática de grandes varejistas de utilizar livros como “iscas” com descontos agressivos pode comprometer toda a cadeia produtiva do setor. Drumond expõe com clareza essa tática: descontos atraentes conquistam consumidores, mas sufocam livrarias que dependem exclusivamente da venda de livros para sobreviver.
Essa situação é um exemplo clássico do que Mises identificou como uma falha de mercado decorrente da concentração de poder econômico. Um mercado verdadeiramente livre deve ser competitivo, com espaço para todos os players, desde grandes redes até livrarias independentes.
A Solução: Liberdade com Responsabilidade
O modelo adotado por países como França, Alemanha e Japão, onde é limitada a concessão de descontos excessivos para livros recém-lançados, apresenta uma solução interessante. Nesse sistema, editoras continuam livres para definir os preços, mas há uma regra simples: durante o primeiro ano após o lançamento, os descontos não podem ultrapassar 10%.
Essa restrição temporária protege livrarias especializadas, incentivando uma concorrência justa, e permite que o mercado funcione de maneira equilibrada. É importante notar que essa medida não interfere na liberdade de preços; ela apenas corrige práticas que, na ausência de regulação, poderiam levar à destruição de pequenos negócios.
Além disso, estudos mostram que esse modelo pode até reduzir os preços sugeridos pelas editoras no médio prazo, já que elas deixam de precisar inflacionar os valores para compensar os descontos praticados por grandes redes. Isso cria um mercado onde livrarias e varejistas generalistas podem competir em igualdade de condições.
Na economia de mercado, a busca pelo lucro incentiva os empreendedores a atenderem as demandas das pessoas. Isso inclui bens materiais, mas também produtos culturais e educacionais. Livros, escolas e universidades prosperam onde a liberdade econômica prevalece, pois somente um mercado livre pode garantir a disseminação do conhecimento sem coerção ou censura (Mises)
Liberdade Econômica e a Cultura do Livro
Ao trazer a perspectiva de Mises para essa discussão, percebemos que a verdadeira liberdade econômica não é apenas a ausência de regulação, mas a criação de um ambiente onde todos possam competir de forma justa. Livrarias especializadas, ao oferecerem mais do que produtos – oferecendo cultura –, são indispensáveis para o equilíbrio desse mercado.
A ideia de limitar descontos não é uma imposição autoritária, mas uma medida prática para evitar que o livre mercado se transforme em um monopólio disfarçado. Como Drumond sugere, esse equilíbrio pode garantir que o Brasil continue avançando como uma nação leitora, com espaço para todos os agentes da cadeia editorial.
Conclusão
Preservar o mercado de livros como espaço de liberdade, tanto econômica quanto cultural, é um desafio que exige equilíbrio e responsabilidade. É possível proteger livrarias, fomentar a leitura e garantir que editoras e varejistas prosperem em um mercado competitivo.
O debate no Congresso Nacional sobre a regulamentação desse modelo no Brasil será um marco importante para o setor. Que possamos aprender com os exemplos internacionais e seguir em direção a um mercado onde livros sejam não apenas um produto acessível, mas um símbolo de liberdade e progresso.
********
Texto na íntegra:
O preço da liberdade e os livros
Por Diego Drumond
Livro e liberdade deveriam ser a mesma coisa. Desde a invenção dos primeiros símbolos, liberdade fomentou leitura e interpretação, que estimularam a circulação de livros, e esse ciclo é liga das principais engrenagens do processo civilizatório. “A liberdade é uma livraria”, ensinou o poeta espanhol Joan Margarit.
A oferta de livros deve ser livre. A demanda também. O conteúdo, sem dúvida, só será de qualidade se produzido isento de sombra censora, escrito sem medo de pensar.
Livros são e devem permanecer sempre livres em todos os aspectos, inclusive nos preços.
Assim como é feito com a maioria dos produtos confeccionados sob livre iniciativa, quem deve calcular e estabelecer o preço de venda de um livro é a empresa que o oferta ao mercado, no nosso caso a editora, que investiu na produção e assumirá os riscos da publicação. No Brasil, a cadeia produtiva dos livros não é tranquila nem voa em céu de brigadeiro, mas é capaz de equilibrar oferta, demanda e preços, sempre fez, funciona.
Como a prática insiste em interferir nas teorias, o mercado editorial apresenta um calcanhar de Aquiles que desafia o pensamento econômico. Longe do senso comum que acredita ser a digitalização do mundo, ou os baixos índices de leitura, nosso ponto mais fraco hoje é exposto por um estratagema antigo, utilizado por varejistas generalistas, e que sufoca nossos pontos de venda especializados. O livro está sendo usado como isca de baixo investimento para pesca e cativação de clientes qualificados. Quem compra e lê livros já venceu ou vai vencer na vida e, nesse sentido, é o peixe que todo varejista deseja em seu aquário.
A minhoca parece suculenta, você é livre para escolher, um forte desconto aparece naquele livro novo, que você já decidiu comprar, porém ainda não escolheu onde. A tentação é grande, o frete é grátis e o anzol é certo. A linha vai te levar diretamente à base de dados de um varejista generalista que almeja vender muito mais do que livros. O esforço dele é conquistar esse leitor e conduzi-lo ao outro lado da tabela de preços, onde mora a margem de lucro.
É uma tática inteligente e agrada consumidores que deduzem que tudo o que varejista faz é para favorecê-lo, melhor atendê-lo e os preços serão sempre favoráveis por ali. Não é ilegal, os descontos são livres. Mas essa tática tem um efeito colateral sério.
Livrarias são varejistas especializados, o faturamento advém preponderantemente da venda de livros. Se tentarem acompanhar os fortes descontos que varejistas generalistas concedem para os livros recém-lançados, marcarão encontro com as bancas de advogados que organizam as recuperações judiciais, como vimos em série, recentemente.
Cada vez que uma livraria fecha ou é reduzida, alguém deixa de descobrir um livro e isso é sempre uma perda para toda a sociedade. Se meu espaço fosse ilimitado eu detalharia como isso forçará até os varejistas a trocarem de isca, lá no dia em que todos nós estivermos lendo menos. Grandes magazines não querem ser livrarias, é muito trabalho para pouco dinheiro.
A principal virtude da livraria consiste em ser um comércio e um aparelho cultural ao mesmo tempo, um negócio gerido com arte e matemática. Mesmo que não venda um só livro num dia ruim, a livraria oferta valor para os que visitam, eleva o bairro e a cidade, traz cultura ao povo. Como escaparmos da armadilha e, ao mesmo tempo, mantermos nossa liberdade econômica?
Cada qual a seu modo, Japão, Espanha, Argentina, Itália, México, França, Alemanha, Inglaterra, Coréia do Sul, Portugal e diversos outros, chegaram à mesma fórmula sofisticada e que deu conta de equalizar o mercado, evitando distorções artificiais, sem ferir a liberdade de preços e a livre iniciativa, rejeitando regulação. É uma solução já antiga, alguns países aplicam com sucesso faz mais de meio século, comprovadamente eficaz para uma disfunção mercadológica recorrente no mundo dos livros.
As editoras determinam livremente os preços e podem modificá-los a qualquer tempo, inexiste tabelamento ou o Estado intervindo no preço do produto. É vedada a concessão de descontos exagerados (acima de 10%) apenas em livros recém-lançados. Depois de um ano, os descontos são liberados. A breve restrição é um lampejo, alcança somente 6% dos livros à venda, mas, com efeito, ilumina a alma das livrarias, que passam a vender o “pão quente” em igualdade de condições, concorrendo em um mercado livre e sobrevivendo para ofertar e difundir todo o restante da produção literária mundial, que vale pouco como isca, mas que exprime todo o conhecimento existente no mundo civilizado e precisa ser semeada.
Estudos sólidos comprovam que esse sistema, no médio prazo, estimula a redução dos preços sugeridos pelas editoras, já que passam a ser menos pressionadas por descontos e deixam de reagir prevendo preços majorados para cobrirem seus custos de produção. Os preços médios entre livrarias e varejistas generalistas findam convergindo numa linha inferior aos patamares anteriores.
O mercado editorial brasileiro adapta, assimila, negocia e burila esse sistema faz mais de vinte anos, equilibrando preservação do livre mercado e justa vedação às práticas destrutivas anticoncorrenciais. Nosso Congresso Nacional decidirá em breve se seguiremos buscando o caminho de uma nação leitora, com livros e livrarias livres.
Viva o livro, viva a liberdade, viva a livraria!
Diego Drumond é vice-presidente da Câmara Brasileira do Livro, diretor da Associação Brasileira de Difusão do Livro, sócio da Faro Editorial e da Drummond Livraria.