Adão e Eva: Vítimas de um Golpe e a Justiça Divina à Luz do Direito Brasileiro
Estagiária: Copilot
A história de Adão e Eva, narrada no livro de Gênesis da Bíblia, sempre foi alvo de interpretações variadas, desde reflexões teológicas até análises socioculturais. Mas o que acontece quando trazemos essa narrativa para o campo do Direito Brasileiro? Uma perspectiva jurídica revela nuances interessantes, especialmente se considerarmos Adão e Eva como vítimas de um golpe e Deus como juiz e executor de uma justiça severa.
Adão e Eva: vítimas ou culpados?
Na narrativa bíblica, Adão e Eva são apresentados como transgressores de uma norma divina: comer o fruto proibido da árvore do conhecimento do bem e do mal. No entanto, quando analisamos os fatos, é impossível ignorar o papel da serpente, que os induz ao erro. Do ponto de vista do Direito Penal Brasileiro, a serpente poderia ser enquadrada como autora de um crime de fraude ou estelionato moral, ao enganar as vítimas para que agissem de forma contrária aos seus próprios interesses. Adão e Eva, nesse contexto, tornam-se vítimas de uma manipulação, incapazes de compreender plenamente as consequências de seus atos.
É válido lembrar que, no Direito Brasileiro, o erro induzido por terceiros pode ser considerado uma excludente de culpabilidade, dependendo das circunstâncias. Nesse caso, a responsabilidade de Adão e Eva seria mitigada, ou até anulada, dada a influência determinante da serpente.
Deus: legislador, juiz e executor
A posição de Deus na narrativa é, no mínimo, intrigante. Ele estabelece a norma, julga a transgressão e aplica a pena. Essa concentração de poderes seria impensável no sistema jurídico brasileiro, que tem como um de seus pilares o princípio da separação dos poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição Federal. No Brasil, o Legislativo cria as leis, o Judiciário as interpreta e o Executivo as aplica. A centralização desses papéis em uma única figura seria vista como autoritária e incompatível com o Estado Democrático de Direito.
A proporcionalidade da pena
A expulsão do Éden, somada às consequências impostas — como a dor no parto para Eva e o trabalho árduo para Adão —, levanta questões sobre a proporcionalidade da pena. No Direito Brasileiro, o princípio da proporcionalidade é fundamental para garantir que as sanções sejam justas e adequadas ao ato cometido. Considerando que Adão e Eva foram induzidos ao erro, seria razoável uma punição tão severa e de caráter perpétuo? Além disso, não houve um devido processo legal. Eles tiveram direito à ampla defesa e ao contraditório, como assegura o artigo 5º, inciso LV, da Constituição? Parece que não.
Direitos fundamentais e a dignidade humana
Sob uma perspectiva mais ampla, a narrativa desafia a ideia de dignidade humana, que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, conforme o artigo 1º, inciso III, da Constituição. Adão e Eva, enquanto "primeiros seres humanos", deveriam ter seus direitos fundamentais protegidos, inclusive o direito à liberdade e à igualdade. A aplicação de uma pena tão severa, sem considerar as circunstâncias atenuantes, seria vista hoje como uma violação desses direitos.
Uma justiça retributiva e arcaica
A história de Adão e Eva reflete uma visão de justiça retributiva, onde a punição é aplicada de forma punitiva e exemplar, sem considerar fatores como reabilitação ou análise das causas do erro. Essa abordagem contrasta com os princípios modernos do Direito Penal Brasileiro, que busca a ressocialização e a prevenção de novos delitos. Em um sistema jurídico mais humanizado, Adão e Eva poderiam ter recebido orientação ou uma oportunidade de reparar seu erro, em vez de uma condenação implacável.
A relação entre culpa e responsabilidade
A narrativa de Adão e Eva também nos permite explorar o conceito de responsabilidade em um contexto jurídico. No Direito Brasileiro, a culpa pode ser dividida em dolo (intenção de cometer um ato ilícito) e culpa (negligência, imprudência ou imperícia). Na história bíblica, é questionável se Adão e Eva agiram com dolo ao comer o fruto proibido, já que foram persuadidos pela serpente. Essa distinção é crucial no Direito Penal, pois a sanção deve levar em conta o grau de responsabilidade do agente.
Além disso, há um paralelo interessante com a ideia de "estado de necessidade", prevista no artigo 24 do Código Penal Brasileiro, que pode excluir a ilicitude de um ato cometido para salvar a própria vida ou evitar um mal maior. Embora o contexto não seja exatamente equivalente, é possível argumentar que Adão e Eva, ao buscar o fruto do conhecimento, estavam agindo sob uma espécie de compulsão moral ou curiosidade inerente à condição humana, algo que mereceria uma interpretação mais compassiva.
O papel da serpente como coautora
Na análise da responsabilidade jurídica, a serpente desempenha um papel fundamental como coautora ou até mesmo como autora intelectual do "delito". No Direito Brasileiro, quem induz ou instiga outra pessoa a cometer um crime pode ser responsabilizado como partícipe, conforme os artigos 29 e 30 do Código Penal. A serpente, com seu discurso persuasivo, configuraria claramente um caso de indução ao erro, deslocando parte significativa da culpa para si. Adão e Eva, enquanto agentes secundários, poderiam ter sua pena atenuada ou até anulada, caso fosse comprovado que agiram sob influência direta.
A ausência de um julgamento justo
Outro ponto relevante é a ausência de um processo justo na narrativa. No Brasil, o devido processo legal é um direito constitucional, garantido pelo artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal. Ele assegura que nenhum indivíduo será privado de seus direitos sem um julgamento justo e imparcial. Adão e Eva não tiveram oportunidade de apresentar suas razões ou defender-se das acusações. Sua condenação foi imediata, baseada exclusivamente na interpretação unilateral de Deus como juiz e executor. Esse cenário, embora simbólico, contradiz os princípios básicos de justiça praticados em um Estado Democrático de Direito.
As implicações intergeracionais da punição
Um aspecto frequentemente negligenciado é a extensão da punição para além de Adão e Eva. Seus descendentes herdaram as consequências de sua ação, sendo marcados pelo chamado "pecado original". Sob a ótica jurídica moderna, isso poderia ser comparado a uma violação do princípio da intranscendência da pena, consagrado no artigo 5º, inciso XLV, da Constituição Federal, que estabelece que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado". Em outras palavras, os filhos não devem pagar pelos erros dos pais. Essa característica da narrativa bíblica levanta questões éticas e jurídicas profundas sobre o conceito de responsabilidade coletiva.
Justiça divina versus justiça humana
Por fim, é importante lembrar que a justiça divina, como descrita na Bíblia, opera em um plano distinto da justiça humana. Enquanto o Direito Brasileiro busca equilibrar princípios como legalidade, proporcionalidade e dignidade humana, a justiça divina, no contexto bíblico, está frequentemente alinhada a objetivos teológicos e morais. Ainda assim, essa comparação nos permite refletir sobre como a justiça evoluiu ao longo do tempo, saindo de um modelo punitivo e retributivo para um sistema mais centrado em direitos e garantias.
Reflexões finais
Trazer a história de Adão e Eva para uma análise jurídica não é apenas um exercício criativo, mas uma forma de questionar conceitos de justiça e responsabilidade sob uma nova luz. Independentemente da crença religiosa de cada um, essa narrativa oferece uma oportunidade de refletir sobre como tratamos questões de culpa, perdão e reparação em nossa sociedade.
No final, talvez a lição mais importante seja que a justiça, seja divina ou terrena, deve ser sempre guiada pela busca do equilíbrio e da humanidade.